Por
Cid Pavão Barcellos e Gisberto Werninghaus
Instituído
em 1990 como parte do Código de Defesa do Consumidor, o recall vem se tornando
uma prática presente nas relações de consumo. Segundo estudo realizado pelo
Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) do Ministério da
Justiça, o volume de recalls feito no Brasil, em 2011, mais que dobrou em
comparação a 2003, chegando a 75 ocorrências. O número, apesar de crescente,
ainda está distante dos obtidos em outros países. Nos Estados Unidos, por
exemplo, onde o recall existe desde a década de 1960, somente no último mês de
dezembro foram feitas 60 campanhas.
A
indústria automotiva sempre esteve no topo da lista brasileira de recall. No
ano passado foi responsável por 55 chamamentos, incluindo veículos e
motocicletas. De acordo com levantamento feito pelo site estradas.com.br, de
2000 até abril deste ano, mais de 8 milhões de veículos foram convocados para
reparos. De janeiro até agora, BMW, Honda, Nissan, Volvo, Porsche, Kawasaki,
Chery, Maserati, Volkswagen e Renault anunciaram recall.
Os
custos de uma campanha de recall podem somar milhões de dólares entre despesas
com peças, mão de obra e divulgação. Todos eles são pagos pelas montadoras, que
podem fazer uso do direito regressivo para cobrarem do fornecedor da peça os
valores despendidos.
A legislação
brasileira determina que o recall seja gratuito para o consumidor, efetivo e
amplamente divulgado em rádio, jornal e TV, de maneira que alcance todos os
públicos expostos aos riscos. Na indústria automotiva, no caso de marcas e
modelos globais, o fabricante do veículo tem a obrigação de comunicar ao
Ministério Público a existência de recall no exterior, mesmo que o procedimento
não venha a ser feito no Brasil.
O
governo e o Poder Legislativo têm apresentado medidas para tornar a prática de
recall ainda mais rígida e eficaz. Em janeiro desse ano, oito projetos sobre o
tema tramitavam na Câmara dos Deputados. Em abril, o Ministério da Justiça
determinou que as campanhas de mídia tragam a foto do produto que deve passar
por reparo e que as mensagens sejam claras em relação ao defeito e suas
implicações. Além disso, lançou um sistema informatizado que enviará, para os
consumidores que desejarem, um e-mail sobre novos processos de chamamento. O
site do DPDC, desde o dia 16 do mesmo mês, publica a existência de novos
recalls.
As
ações não visam somente o fabricante. Uma portaria conjunta do Ministério da
Justiça e do Denatran, em vigor desde 2011, estabelece responsabilidade ao
proprietário do veículo pela realização do recall. As campanhas não atendidas
no prazo de um ano constarão no Certificado de Registro e Licenciamento de
Veículo.
Indenizações
e multas
Quando
um acidente é causado por defeito de peça, as montadoras podem ser condenadas a
pagar indenizações milionárias. A família do cantor e compositor Chico Science,
morto em um acidente de carro em 1997, fechou acordo com a Fiat e recebeu
ressarcimento por danos morais e materiais. Em reportagem da Agência Folha, de
fevereiro de 2007, o advogado da família, Antônio Campos, afirma que “foi a
maior indenização paga a pessoa física pela indústria automobilística do país”.
O valor não foi revelado, mas as partes informaram que ficou abaixo de R$ 10
milhões.
Um
dos casos mais polêmicos da história envolve a japonesa Toyota. A demora em
reconhecer o problema — o tapete dos carros travava o acelerador, impedindo que
o motorista freasse — rendeu à empresa uma multa de cerca de R$ 27 milhões.
Além disso, a companhia fez um acordo fora dos tribunais e pagou US$ 10 milhões
aos parentes de uma das vítimas, um policial que morreu com sua família na
Califórnia, em 2009, em um acidente provocado pela aceleração descontrolada de
seu veículo.
As
causas que envolvem responsabilidade civil em acidentes de automóveis são
complexas. As montadoras devem se preparar para garantir elementos suficientes
para pleitear o ressarcimento da indenização paga ao consumidor em futura ação
de regresso, contra o fabricante da peça. Um dos meios é promover a produção
antecipada de prova técnica pericial, via ação cautelar, quando o veículo for
submetido ao reparo.
Origem
do recall
Segundo
o Código de Defesa do Consumidor, recall é o procedimento pelo qual o
fornecedor informa ao público consumidor os defeitos detectados nos produtos ou
serviços — após terem sido colocados no mercado de consumo. Seu objetivo é
proteger e preservar a vida, a saúde, a integridade e a segurança do
consumidor, bem como evitar ou minimizar quaisquer espécies de prejuízos, quer
de ordem material ou moral.
A
prática do recall teve início nos Estados Unidos, nos anos de 1960, depois que
o advogado Ralph Nader descobriu e denunciou defeitos em um modelo de
automóvel. No Brasil, o recall se tornou lei em 1990 com o lançamento do Código
de Defesa do Consumidor.
Segundo
levantamento feito pela revista Veja, em 2010, o primeiro recall registrado
pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor aconteceu em 1998 e foi
feito pela Mercedes Benz. Entretanto, ainda de acordo com a revista, “a Ford
confirma que em 1970 chamou 50 mil compradores do modelo Corcel 1969 para
consertar uma possível instabilidade no veículo”.
Dificuldades
do recall
Apesar
da obrigação de grande disseminação do recall, para que alcance toda a
população, 60% dos consumidores que são afetados pelo defeito não fazem os
reparos necessários para sua própria segurança e, também, das outras pessoas.
Nos
últimos 10 anos, seis milhões de automóveis foram chamados para recall. De
janeiro até dezembro de 2012, 28 recalls foram feitos, mas mesmo assim, quatro
entre 10 consumidores não aparecem para a reparação ou troca de seus produtos,
segundo o Ministério da Justiça. Cerca de 81% dos brasileiros não atenderam ao
recall de seus automóveis em 2011, aumentando o risco de acidentes nas ruas,
pois o número de veículos sem condições de segurança também aumentou.
Também,
uma grande porcentagem das pessoas que não comparecem ao recall, são aqueles
consumidores que compraram seus automóveis de segundos ou terceiros. Para a
proteção do consumidor, o Denatran obriga as montadoras a mandar um relatório
de atendimento do recall a eles. Assim, se algum veículo não atendeu ao recall,
essa informação é gravada no Renavam e deve constar no licenciamento do carro.
O
consumidor deve sempre ficar atento às chamadas de recall, para sua própria
segurança. A negligência no reparo ou troca do produto comprometido pode causar
problemas no licenciamento do veículo. Recall não é questão de consumo, mas de
segurança!
Fontes
Cardoso,
Helio. Recall, por que no Brasil é diferente?. Blog Novidades Automotivas -
novidadesautomotivas.blogspot.com. Data de acesso: 18 de abril de 2012.
Canuto,
Luiz Cláudio. Câmara analisa oito propostas sobre recall. Agência Brasil. Site
www2.camara.gov.br. 3 de janeiro de 2011. Data de acesso: 3 de maio de 2012.
Baptista,
Renata. Dez anos após morte, família de Chico Science recebe indenização.
Agência Folha - 2 de fevereiro de 2007. Data de Acesso: 2 de maio de 2012.
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