“A Teoria da cegueira deliberada, também conhecida
como Teoria das Instruções da Avestruz, Willful Blindness ou ainda Ostrich
Instructions, é proveniente dos Estados Unidos, onde a Suprema Corte
Norte-Americana julgou o caso de um vendedor de carros, os quais eram todos de
origem ilícita, roubados, furtados.
No entanto não ficou comprovado que os agentes tinham
ou não conhecimento da origem daqueles veículos. Esta teoria existe quando o
agente finge não enxergar a ilicitude da procedência de bens, direitos e
valores com o intuito de auferir vantagens.
O nome desta teoria provém exatamente do ato de uma
avestruz, qual seja, enterra sua cabeça na areia para que não veja ou escute
más notícias, evitando assim, tomar conhecimento de fatos desagradáveis. É exatamente
o que acontece com a pessoa que finge não saber que está praticando um ato
ilícito, “enterra” a cabeça para não tomar conhecimento da natureza ou extensão
deste ilícito.” (1)
P. ex., um comerciante que recebe dinheiro ilícito e
finge não saber de sua origem; pessoas que transportam pacotes com mercadorias
ilícitas (drogas, p. ex.) e fingem desconhecer a ilicitude contida no pacote.
A teoria em análise diz que atua dolosamente (dolo
eventual) aquele que “finge de bobo” em determinadas situações que as
circunstâncias indiquem estar cometendo um ato ilícito. O agente evitar
conhecer a origem do dinheiro, p. ex., ao pensar “não vou nem perguntar, porque
eu sei que é ilícito”, pois se “eu verificar que é ilícito vou estar cometendo
crime.” É o famoso “eu não sei de nada.”
A teoria da cegueira deliberada ou das instruções do
avestruz tem exatamente por objetivo acabar com o “eu não sabia”; “eu não sei
de nada”.
Essa teoria tem sido aplicada no Brasil nos crimes de
lavagem de dinheiro, mas já ocorre a sua aplicação em determinados crimes
eleitorais, quando, p. ex., o candidato presenteia eleitores para a obtenção de
voto.
Um caso que ficou conhecido no Brasil, dando origem ao
filme “Assalto ao Banco Central”, foi o furto no Banco Central em Fortaleza, em
06 de agosto de 2005, quando uma quadrilha furtou, através de um túnel exatos
R$ 164.755.150,00 (cento e sessenta e quatro milhões, setecentos e cinqüenta e
cinco mil, cento e cinqüenta de reais), sendo 3.295.103 notas de cinqüenta
reais.
Após o furto, membros da quadrilha deslocaram-se a uma
concessionária, na qual compraram 11 automóveis com R$1.000.000 (um milhão de
reais) em espécie.
O juiz de primeira instância aplicou a teoria em
análise, haja vista que pelas circunstâncias (um milhão de reais em espécie)
para a compra de 11 carros, os responsáveis pela concessionária “fingiram de
bobo” (passaram-se por cego) para não saber a origem ilícita do dinheiro
utilizado na compra dos veículos.
Em primeira instância foram condenados com fulcro no
art. 1º, § 2º, inc. I da Lei 9.613/98 (Lavagem de dinheiro):
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem,
localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou
valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:
VII - praticado por organização criminosa.
Pena: reclusão de três a dez anos e multa.
§ 2º Incorre, ainda, na mesma pena quem:
I - utiliza, na atividade econômica ou financeira,
bens, direitos ou valores que sabe serem provenientes de qualquer dos crimes
antecedentes referidos neste artigo;
Em segunda instâncias os responsáveis pela venda dos veículos foram absolvidos, sob o fundamento de que a Lei de Lavagem de Capitais
exige o dolo direito, e não o dolo eventual.
Em outras palavras, a teoria da cegueira deliberada
afasta a idéia de que o agente infrator ficará impune caso "feche os olhos
para o ilícito", conforme as circunstâncias, sendo que deveria ter
procedido com cautela e os cuidados necessários para verificar a origem, a
procedência ilícita do dinheiro recebido, do produto adquirido, etc.,
incorrendo em dolo eventual, se o crime admitir.
Enfim, a desculpa de que “eu não sabia” não cola! Se
não sabia deveria ter procurado saber!
(1) MONTEIRO, Alves Tatiana. Aplicação da Teoria da
Cegueira Deliberada no Brasil. Disponível em
http://www.conjur.com.br/2009-set-28/necessario-dolo-especifico-caracterizacao-corrupcao-eleitoral.
Acesso em: 02Jan12
Rodrigo Foureaux
Enviado por Rodrigo Foureaux em 02/01/2012
Reeditado em 02/01/2012
Código do texto: T3417943
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FoureauxTeoria da cegueira deliberada: a desculpa de que "eu não
sabia". Disponível em: http://www.recantodasletras.com.br - 1 de janeiro
de 2012). Você não pode criar obras derivadas.
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